A missão
À cerca de 5 anos, fui contactada por um casal holandês (que estava a comprar uma moradia quase em ruinas), para fazer um projeto de licencamento... até aqui, tudo normal. Dei seguimento da melhor maneira que soube. À distância da internet, fizemos estudos e layouts, trocámos ideias (imagens que todos os clientes acabam por recolher quando vão construir ou remodelar), ajustámos e saiu uma projeto de uma bela moradia, pouco usual, só com 1 quarto, no meio de duzentos e tais metros quadrados. Tudo certo... pediram-me na altura para encontrar um construtor que tivesse bom preço e que eu confiasse. Recolhi duas propostas. Era para fazer gestão da obra (até já tinham enviado o dinheiro adiantado).
Passados uns 3 meses, recebi um email (dos poucos que nunca mais me esqueci) com palavras duras, entre a quais a solicitar a devolução do valor enviado e a descartar os meus serviços, não eram assim tão necessários, pois os dois agentes imobiliários iriam fazer esse serviço e até tinham conseguido um orçamento mais económico. Foi das maiores desilusões que tive profissionalmente, pois estes agentes, também eles meses antes, tinham pedido a minha ajuda e opinião a remodelar a sua casa.
Nunca apaguei esse email...até à uns meses atrás.
Mas... na primavera do ano passado, recebi um telefonema da fiscalização da câmara, que não tinham contacto dos senhores, mas que estava em execução um processo judicial, e pretendiam saber o que eu sabia do assunto... assunto esse... a moradia estava concluida, sem licença, sem autorização, sem nada.
Bom... a menina a quem só calha clientes "escolhidos" a dedo, lá vai ser novamente a ajuda deste casal, cinco anos depois. Ambos ficaram sem palavras... ambos tentavam conter as lágrimas de desespero e tristeza... ambos fizeram em Portugal o seu "projeto de vida", mas um certo construtor e uns certos consultores, ficaram-lhes com muito dinheiro e a obra não foi feita. Eles venderam tudo no seu país. Não têm emprego, são reformados. São apenas eles e mais ninguém. Custou-me ouvir a história, custou-me sentir vergonha do meu país, custou-me sentir que realmente existem pessoas capazes de tudo. Conquistar a confiança com alojamento na sua casa, com prontidão, apenas por interesse... que vergonha de país o nosso! e ficam sempre impunes.
Mas, com muito esforço, lágrimas e trabalho, e com recurso a um financiamento (que não era suposto), fizeram a sua casa, à sua imagem... e que linda que ficou.
Não consigo imaginar o que este casal tem passado, tristes e revoltados. À cerca de 2 ou 3 dias, pediram que fosse ter com eles a casa. Claro que fui com a ideia que pretendiam saber com estaria o processo na câmara (como disseram que não tinham todo o valor necessário para o processo, combinámos ir fazendo aos poucos), mas não era isso... de lágrimas nos olhos (ela e ele) disseram... "temos novidades da casa... vamos ter de vender", e as lágrimas envergonhadas escorriam sem que conseguissem evitar. Não esperava. Não estava preparada para o que estava a acontecer. O que devia eu fazer? ali em frente a eles, sentados na sua bela mesa, na sua bela casa, na "menina dos seus olhos"... como?... e pediram "ajude-nos a vender e a conseguir comprar outra para ficarmos sem prestações, não conseguimos viver assim, não somos felizes"... engoli em seco e respirei bem fundo a tentar controlar a minha emoção. Ainda hoje, passados dias, o meu pensamento esta com essa imagem várias vezes ao dia. Porque tem de ser assim? Eles merecem ter o seu cantinho, felizes... e eu... claro que vou ajudar, como não?
Uma amostra, nem imaginam os pormenores interiores: